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domingo, 7 de agosto de 2011

Seleção de projetos

Hoje parei para ler algumas mensagens oriundas de grupos de discussão na internet dos quais faço parte. Há tempos que não fazia isso em razão de compromissos profissionais e particulares...

Uma discussão me chamou a atenção: a questão da seleção de projetos. Independente do que possa ter despertado essa discussão, é inegável que ela seja fundamental. Portanto, acho que o tema merece atenção.

Seleção de projetos nos meios profissionalizados nessa gestão é assunto antigo e bem desenvolvido. Não é assunto esgotado, mas não está no nível de argumentação frágil que o Terceiro Setor utiliza. Frágil não no sentido de “desimportante”, mas frágil no sentido de resolver a questão.

Selecionar projetos é um processo de tomada de decisão e há uma infinidade de ferramentas gerenciais que auxiliam esse processo. Desde avaliações econômicas (comuns em projetos empresariais) até avaliações que utilizam variáveis e critérios claramente subjetivos, facilitando que as subjetividades fiquem menos expressivas no resultado final.

Contudo, construir um processo de tomada de decisão cujo resultado seja a seleção de um conjunto de projetos/programas em detrimentos dos demais, não é um processo simples. Não se trata de escolher um método pré-existente, mas de criar uma metolodologia de seleção que utilize tais ferramentas no sentido de atingir os resultados esperados com esse conjunto de projetos. Aqui surge um nó nesta questão: ter objetivos.

A diretriz principal para qualquer processo decisório é a expectativa de resultados. Se não há um resultado mais importante que outro, não há como valorar decisões. Afinal, o que qualifica uma decisão é o grau com que ela contribui para se atingir um objetivo. De modo curto e grosso: sem objetivo, não há processo decisório qualificado. Ou, ainda: “não há vento a favor pra quem não sabe onde vai” (não me lembro o autor desta frase no momento).

Em outras palavras, o que queremos dizer é que não há como implementar um processo decisório razoavelmente estruturado se não houver um plano de objetivos a serem atingidos igualmente bem estabelecido. Em linguagem gerencial isso significa: não é possível construir um Portfólio de Projetos sem um Planejamento Estratégico. Vale lembrar que um conjunto de projetos quaisquer não é um portfólio (talvez seja uma carteira de projetos, apenas). O que caracteriza a existência de um portfólio é a conexão que esse conjunto de projetos tem com os objetivos estratégicos de uma organização (pública, privada ou do Terceiro Setor).

Um mecanismo de tomada de decisão muito utilizado nos órgãos públicos ou no Terceiro Setor é a decisão por colegiados, assembléias, etc.. Mas isso não é, nem de longe, um processo decisório apropriado para seleção de projetos. Vale lembrar outra frase (da qual também não me lembro o autor): “pessoas individualmente brilhantes costumam tomar decisões medíocres em grupo”. O que qualifica a tomada decisão de uma pessoa são os critérios utilizados e a forma de considerá-los. Fazemos isso a todo o momento de forma tão natural que não percebemos os processos de raciocínio que usamos. Mas quando em grupo, esse processo não corresponde ao de nenhuma das pessoas, mas sim a um processo novo construído coletivamente com base em critérios quase que aleatórios (pois não há controle sobre os mesmos).

O “bom” grupo para se tomar uma decisão não é aquele grupo que represente todos os interessados na decisão. Se assim fosse, todas as assembléias, colegiados, conselhos, etc. tomariam apenas decisões brilhantes. Além de representar os interessados nas decisões, um bom grupo de decisores deve, antes de qualquer coisa, conhecer o processo de tomada da decisão. Isso significa conhecer as avaliações a serem feitas, saber avaliar seus resultados com base nos critérios, entender a importância e conseqüência de cada critério de decisão, etc. Enfim, a qualidade da decisão tomada está mais fundamentada no processo de decisão utilizado e no conhecimento e domínio que os grupo decisor tem dos critérios de análise e ponderação para a tomada da decisão, do que na representatividade da constituição do grupo.

Assim, não há qualquer garantia de que um grupo de alpinistas tome a melhor decisão para escalar uma montanha ou que um grupo de músicos escolha o melhor repertório para um show. Da mesma forma, não há garantias de que um conselho municipal de cultura decida corretamente o que é melhor para a cultura da cidade ou que o conselho municipal de saúde consiga melhorar as condições de saúde de uma população. O segredo desse sucesso vai além da constituição do grupo decisor e está muito mais atrelado à capacidade dele de usar um bom processo decisório que balize de fato as decisões, de modo a alinhá-las com os objetivos previamente definidos num processo de planejamento.

Pensemos, então, na forma como são constituídas nossas estruturas de decisão. Como são nomeados os ocupantes dos cargos importantes? Como não nomeados os componentes de nossos conselhos públicos? Como são estruturados os processos de seleção de projetos?

Pensando nessas coisas, fica fácil entender os questionamentos existentes nos mais diversos meios onde há questões públicas em discussão. Fica igualmente fácil entender porque grandes nomes de diversas áreas, quando ocupando cargos de comando, não conseguem continuar “grandes”. O conhecimento específico nas áreas onde se precisa decidir é, sem dúvida, fundamental. Mas um bom processo decisório é igualmente importante e sua construção normalmente se baseia em um conhecimento bem diferente do tema a ser discutido. Boas decisões em grupo não nascem apenas de conhecimento técnico sobre o que é discutido, mas, sobretudo, da construção de um bom processo decisório, que garanta alinhamento com um bom conjunto de objetivos.